Monday, September 29, 2008

NO QUE PENSA A CLASSE POLÍTICA

Lá fora, o que se discute é a derrapagem financeira : se é profunda e de duração imprevisível, se há processo de a atenuar, se o neoliberalismo tem os dias contados.
Entre nós o que a classe política discute acirradamente é o divórcio sem culpa e o casamento gay – problemas a que a generalidade do país é estranha.
Quando em velhos tempos estudei Direito Romano fiquei a saber que uma das formas do casamento era o usus : o uso por seis meses equivalia a um casamento formalizado.
Não seria altura de ressuscitarmos esta fórmula ?
A nova Lei do Divórcio não altera nem diminui o número de divórcios, que já se fazem sem praticamente discutirmos a culpa. Só servirá para de forma mais complicada se discutir nos Tribunais a partilha dos bens.
Quanto ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, de nada adianta protelar a solução, que está à vista : esses casamentos vão ser autorizados, agora ou daqui a um ano ou dois. E não vai haver nenhum terramoto, como se provou ali na vizinha Espanha. Nem, por isso, nenhum partido vai perder votos. Este é um domínio em que o país está amadurecido : a maioria não concorda, tem uma atitude de encolher de ombros, não se opõe a que uma minoria encontre aí “a felicidade individual”, para usarmos a linguagem expressiva de um deputado do P.S. que quer ao menos uma vez ter liberdade de voto.
Não será altura de os deputados pensarem nos assuntos sérios que afligem o país ?

Wednesday, September 17, 2008

O PREÇO DA GASOLINA

O Ministro da Economia veio, a medo, fazer este apelo patético às gasolineiras : que desçam o preço da gasolina, já que o crude desceu de quase 150 dólares para praticamente 90.
A esse apelo respondeu de imediato a B.P. : subiu a gasolina em mais um euro.
Para que serve o Governo se quem manda sem obediência a regras mínimas de decência são as grandes empresas ? Para que serve afinal a regulação ou a legislação contra o cartel ?
Percebemos assim que, no limite, nos possam aparecer de novo os camionistas a barrar as estradas como sendo o único caminho capaz de dar frutos.
Ou que o sonho das nacionalizações, como há 30 anos, volte a estar na ordem do dia.
De resto, o capitalismo à americana explica-nos como funciona “o mercado” : quando uma grande empresa está em via de falir, o Estado (ou seja : os contribuintes do país) aparece para a salvar, nacionaliza-a, mas sem ao menos exigir que quem a comanda restitua os milhões com que se pagou a título de gestão eficaz ainda em relação ao último ano (ao nosso nível, foi o que sucedeu entre nós com a anterior gestão do B.C.P.).
Percebe-se a insatisfação dos que pensam que ser de Esquerda é sobretudo actuar de maneira diferente no campo social e económico e que é de pouco interesse geral lutar pelo divórcio sem culpa e pelo casamento dos homossexuais igual ao dos heterossexuais.

Thursday, September 11, 2008

O CRIME VIOLENTO

Li hoje no jornais que aquele indivíduo que numa Esquadra da Policia do Algarve despejou meia dúzia de tiros num outro que contra ele pretendia apresentar queixa não foi submetido a prisão preventiva pelo juiz que o ouviu.
Não sei as razões por que foi mandado em liberdade, mas o crime cometido – tentativa de homicídio – era passível de prisão preventiva.
Atitudes como esta por parte de juizes significam, objectivamente : a desmotivação da polícia, que vê posto em liberdade quem dá tiros mesmo dentro das suas instalações, pondo em risco a vida dos próprios policias; a motivação e o alento dado aos criminosos, que verificam que despejar uma arma de fogo sobre outro ser humano não é um facto grave, a merecer punição severa.
Vejo na Televisão com um encolher de ombros sucessivos debates, em que apregoados especialistas nos dizem como é que há-de ser travada a luta contra esta onde de crimes – e depois de cada debate o crime aparece multiplicado, para gáudio da comunicação social, que encontra aí notícias fáceis para nos entreter.
Horroriza-me que os partidos da Oposição façam deste tema sensível matéria de lucro partidário, como se a polícia que temos, a investigação que temos ou os magistrados que temos tivessem sido fabricados por Sócrates.
Esta onda de crime combate-se sem histeria, de cabeça fria. E só terá êxito se os criminosos perderem a sensação de impunidade – hoje parece que assaltar uma bomba ou um banco é um facto comezinho, de realização fácil, normalmente sem consequências, tido até como heróico por certa comunicação social.
Mas se a policia começar a prender os assaltantes – e hoje já há um maior êxito neste campo –, se a Televisão der às prisões o mesmo relevo que dá aos assaltos (embora aquelas sejam menos relevantes do que estes como notícia), se a investigação criminal for mais eficiente e, sobretudo, se os julgamentos e condenações não forem remetidos para as “calendas gregas” – estará encontrado, como todos sabemos, o caminho da luta eficaz contra o crime.
O agravamento das penas ou a prisão preventiva a rodos não resolvem problema nenhum.
Servem apenas para uma certa Direita travar a sua luta política.
E, depois, temos que meter na cabeça : as sociedades modernas são mais perigosas do que o mundo rural.
Mas eu lembro-me sempre de que há mais de 50 anos, quando na província iniciei a carreira como agente do Ministério Público, tive de debater-me num curto prazo com três crimes de homicídio (à sacholada e por causa das águas, que era essa a luta na altura). Só que estes homicídios não eram notícia dos jornais, é como se não existissem e as pessoas viviam assim em tranquilidade.

Monday, September 8, 2008

UMA “RENTREE” MORNA

Depois de ver os aviões às cambalhotas – não percebo que para isto se gastem milhões – vi, por vício, parte do discurso do secretário-geral do P.C.P. e do apregoado discurso de Manuela Ferreira Leite.
O discurso desta comentou-o aquele invocando o refrão : “Tudo como dantes , quartel general de Abrantes”. O que me fez sorrir, vindo o comentário de quem diz o mesmo há mais de trinta anos, desde o tempo do saudoso Estaline.
Manuela Ferreira Leite inaugurou um estilo político a que não estávamos habituados : fala pouco, não diz frases bombásticas, não tem pose de actriz, é por natureza modesta, desagrada à partida à comunicação social, que fica sem material para nos entreter e que sempre morreu de amores pelo estilo Santana Lopes, que sempre endeuseu, considerando-o um comunicador e um orador notável (tão notável que colocou o P.S.D. nas vascas da agonia).
Mas com o seu silêncio, a que já chamam o vazio político, desagradará por igual a quem vota no P.S.D. e que dos políticos em geral tem uma imagem negativa e que dos discursos políticos nem sequer quer ouvir falar ?
O sucesso eleitoral do P.S.D., como é habitual, dependerá sobretudo do insucesso governativo do P.S., mas para o sucesso daquele será também necessária a unificação do partido, a mobilização dos militantes, o aparecimento no topo de figuras capazes de inspirar confiança, o estremar das diferenças com o P.S. – tarefas mais relevantes do que a de debitar banalidades todos os dias na comunicação social.
Que haja um P.S.D. forte, capaz de ser alternativa válida, interessa-nos a todos, mesmo àqueles que, como eu, não lhe darão possivelmente o seu voto.
Mas as obrigações do P.S.D. não se limitam à preparação das eleições daqui a um ano. Cabe-lhe, como principal partido da Oposição, a obrigação de se pronunciar sobre cada medida concreta relevante do Governo, propondo alternativas e fomentando um debate profícuo, o que manifestamente não foi feito durante estes três anos, com prejuízo para o Governo e sobretudo para o país.

Friday, September 5, 2008

O CASO PAULO PEDROSO

Ficou-me gravado na memória esse espectáculo pouco digno : um juiz a entrar, desnecessariamente, na Assembleia da República, com a Televisão atrás dele, para comunicar a prisão do deputado Paulo Pedroso.
Causou-me estranheza e preocupação o facto de o labeu da pedofilia ter atingido ao mesmo tempo as figuras de proa do P.S. na altura : o próprio secretário-geral do Partido, Jaime Gama e Paulo Pedroso.
A sentença agora proferida diz-nos que a prisão de Paulo Pedroso, iniciada com aquele indigno espectáculo mediático na Assembleia da República, foi um “erro grosseiro” (não um erro simples, a que estamos todos sujeitos, por não gozarem os Juizes de infalibilidade do Papa).
Mas esta é a ponta do véu. Falta-nos saber – e isso é essencial, para salvaguarda do Estado Democrático – se houve ou não uma manobra que na época visou decapitar o principal partido da Oposição.
O tema não está encerrado.